Agora que estamos em época de exames e em que surgem opiniões a favor e contra os ditos exames, gostaria aqui de tecer algumas considerações.
Em primeiro lugar, penso que os exames nacionais são imprescindíveis, o leque de disciplinas a que são realizados deve ser alargada e o seu peso deve ser maior. Quer no básico quer no secundário.
Mas, quando falo em exames, são exames a sério e não o que está actualmente instituído e é anualmente produzido pelos serviços do Ministério da Educação.
Já agora, gostaria de esclarecer que, ao contrário do que afirmaram recentemente membros do governo responsáveis pela educação, não são os professores que fazem os exames, mas sim alguns professores destacados, acredito que pela sua competência, pelos serviços do ME. Deixo a pergunta: será que um serviço que elabora exames e que está na dependência directa do poder político pode ser totalmente independente durante o processo de elaboração dos exames? Concordo com o Nuno Crato que afirmou ainda recentemente:
Os exames devem sair do Ministério da Educação, criando um gabinete de avaliação independente, até porque temos vindo a assistir a algo sem precedentes que é a utilização da avaliação como arma política.
Quanto ao facilitismo que considero estar instalado nos exames nacionais, não vou analisar a dificuldade das perguntas que têm saído, pois são analisadas pelas competentes sociedades científicas. Vou sim focar a questão dos formulários e sua evolução ao longo das mudanças programáticas, bem como a questão das máquinas de calcular gráficas e o modo como são utilizadas pelos alunos.
Vejamos a evolução (recente) dos formulários:
Os exames que realizei, no início dos anos 90, não tinham formulários. Tínhamos que saber as fórmulas a utilizar e a sua aplicabilidade. De seguida mostro a evolução dos formulários fornecidos nos exames das disciplinas de Matemática, Física e Química (estes dois últimos substituídos mal, quanto a mim, pela disciplina de Ciências Físico-Químicas - desde a reforma do secundário proposta por David Justino, que o ensino das ciências no secundário está uma sombra do que já foi).
Exame de Matemática de 12º, “programa antigo”, de 2000.
Formulário fornecido: Não há!
Exame de Matemática de 12º, “programa ajustado”, de 2000.
Formulário fornecido: O ajuste possibilitou que se fornecesse uma página repleta de fórmulas. Clique na imagem para que a possa ver em bom tamanho.
Exame de Matemática de 12º, de 2008.
Formulário fornecido: Clique na imagem para que a possa ver em bom tamanho.
Exame de Física de 12º, “programa antigo”, de 2000.
Formulário ou constantes fornecidas:E é tudo! O aluno tinha que saber o resto. Faço notar que a calculadora permitida nesta altura era uma simples calculadora científica, não gráfica.
Exame de Física de 12º, “programa novo”, de 2007 (último ano em que houve exames de Física de 12º).
Formulário fornecido: Passámos de zero fórmulas para 3 páginas de fórmulas. Clique nas imagens para que as possa ver em bom tamanho.
Exame de Química de 12º, “programa antigo”, de 2000.
Formulário ou constantes fornecidas: Não são fornecidas fórmulas e apenas as constantes necessárias, como constantes de solubilidade, algumas massas moleculares, constante de Planck,… O óbvio e justo.
Exame de Química de 12º, “programa novo”, de 2007 (último ano em que houve exames de Química de 12º).
Formulário fornecido: Passámos de zero fórmulas para 2 páginas de fórmulas. Clique nas imagens para que as possa ver em bom tamanho.
Exame de Física e Química A de 11º/12º, de 2009.
Formulário fornecido: Clique nas imagens para que as possa ver em bom tamanho.
Pergunto: Com exames que contêm formulários destes, o que se exige mesmo dos alunos de ciências? E note-se que, para além de fornecerem as "fórmulas", ainda é explicado o significado de cada símbolo e alguma teoria subjacente.
Poderíamos pensar que, agora que dão as fórmulas, os raciocínios seriam mais elaborados e as relações a fazer mais complexas. Nada mais longe da verdade. Os cálculos são bastante mais simples que os exigidos anteriormente e os problemas também não obrigam a raciocínios mais complexos.
Para além destes formulários, passou a ser permitida a utilização da calculadora gráfica, ao contrário dos antigos exames de Física e Química de 12º.
Claro que os actuais programas focam muito o uso das capacidades gráficas das calculadoras que, de facto, têm imensa utilidade. Mas o que acontece nos exames? Será que essas capacidades estão a ser utilizadas?
Desde que, em 2006, foram implementados os exames de Física e Química A, não houve um único exercício nestes exames que tivesse obrigado à utilização das tão importantes e louvadas capacidades que as calculadoras gráficas possuem. Ou seja, qualquer calculadora científica não gráfica permitiria resolver as questões dos exames.
Para que têm então servido as extraordinárias capacidades das actuais calculadoras? Pura e simplesmente para cabular. Mas com exames que contêm formulários destes, ainda são necessárias cábulas? Acham que exagero?
Continua no próximo post, que este vai longo…
Se tiver algo a dizer sobre o tema, convido-o a deixar um comentário.